Pondera, Pandora, como se isto fosse um diário

Pondera, Pandora, como se trabalhasse para rever-se, inteira, neste diário

Um ou dois aforismos
Não sei explicar o motivo, mas sempre ouvi com um misto de curiosidade e desconfiança as pessoas que gostam de dar opinão introduzida mais ou menos assim: "como diz o poeta" ou "e como disse o outro". Apesar disso, coleciono alguns aforismos, cujos autores eu prefiro indicar a deixar no ar.

Teixeira de Pascoaes, por exemplo, tinha uns fantásticos: "Amar é dar à luz o amor, personagem transcendente"; "Só os olhos das árvores vêem a esperança que passa"; "Existir não é pensar; é ser lembrado"; "A indiferença que cerca o homem demonstra a sua qualidade de estrangeiro"; "Vivemos como num estado de transmigração para a nossa fotografia".

Ele viveu em Amarante! Pena que não se respire o mesmo ar nos dias de hoje...

O aforismo dele de que eu mais gosto, no entanto, entre os que saíram publicados pela Assírio & Alvim, traz o seguinte:

"A seara não pertence a quem a semeia, pertence ao bicho que a rouba e come".

Sendo homem da terra, do chão, dos cheiros da natureza, muito embora culto, eu só posso concordar. Para um espírito muito suave - a não ser quando sente-se desafiado -, esse tipo de sabedoria condensada é sem dúvida ensinamento.


sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Para "enfeitar o pensamento", como diz a música...




Fonte: acervo pessoal de Betina dos Santos Ruiz

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Às voltas com as orações (dos loucos e dos poetas)



O poema com que hoje volto ao blog, fui buscar nas minhas lembranças de há uns 10 anos... 
As aulas eram novas, então,  e eram empolgantes.
Colegas de turma doces e disponíveis para entender, ficavam comovidos, saíam transformados e ainda riam - riem até hoje, muito, dou a minha palavra.
O autor do poema, meu Deus o autor! Mais um mexicano assaltado por grandes temores e fortes luzes. Trágico, conturbado, preciso.
Há minutos, ouvindo uma música brasileira ("Oração ao Tempo", que eu também transcrevo), deu-se o cruzamento e pronto, verdade seja dita: 

a gente se perde para ter alguma chance nesse mundo e, depois, haja amor, haja prática gentil, haja doçura e haja prudência, que esse mundo não é fácil, põe-nos mais ao alcance das mãos o que estilhaça do que nos dá fé do que constrói! E o que constrói está dentro, é desde sempre nosso...

Eu por cá ando a subir pelas paredes de um poço, o mais real que eu vi, e sei que haverá dia claro quando chegar ao topo.


Hoy Como Nunca

 

Ramon Lopez Velarde



A Enrique González Martínez
Hoy, como nunca, me enamoras y me entristeces;
si queda en mí una lágrima, yo la excito a que lave
nuestras dos lobregueces.
Hoy, como nunca, urge que tu paz me presida;
pero ya tu garganta sólo es una sufrida
blancura, que se asfixia bajo toses y toses,
y toda tú una epístola de rasgos moribundos
colmada de dramáticos adioses.
Hoy, como nunca, es venerable tu esencia
y quebradizo el vaso de tu cuerpo,
y sólo puedes darme la exquisita dolencia
de un reloj de agonías, cuyo tic-tac nos marca
el minuto de hielo en que los pies que amamos
han de pisar el hielo de la fúnebre barca.
Yo estoy en la ribera y te miro embarcarte:
huyes por el río sordo, y en mi alma destilas
el clima de esas tardes de ventisca y de polvo
en las que doblan solas las esquilas.
Mi espíritu es un paño de ánimas, un paño
de ánimas de iglesia siempre menesterosa;
es un paño de ánimas goteando de cera,
hollado y roto por la grey astrosa.
No soy más que una nave de parroquia en penuria,
nave en que se celebran eternos funerales,
porque una lluvia terca no permite
sacar el ataúd a las calles rurales.
Fuera de mí, la lluvia; dentro de mí, el clamor
cavernoso y creciente de un salmista;
mi conciencia, mojada por el hisopo, es un
ciprés que en una huerta conventual se contrista.
Ya mi lluvia es diluvio, y no miraré el rayo
del sol sobre mi arca, porque ha de quedar roto
mi corazón la noche cuadragésima;
no guardaba mis pupilas ni un matiz remoto
de la lumbre solar que tostó mis espigas;
mi vida sólo es una prolongación de exequias
bajo las cataratas enemigas.


Oração ao tempo

Caetano Veloso
Es um senhor tão bonito

Quanto a cara do meu filho
Tempo tempo tempo tempo
Vou te fazer um pedido
Tempo tempo tempo tempo

Compositor de destinos
Tambor de todos os ritmos
Tempo tempo tempo tempo
Entro num acordo contigo
Tempo tempo tempo tempo

Por seres tão inventivo
E pareceres contínuo
Tempo tempo tempo tempo
És um dos deuses mais lindos
Tempo tempo tempo tempo

Que sejas ainda mais vivo
No som do meu estribilho
Tempo tempo tempo tempo
Ouve bem o que te digo
Tempo tempo tempo tempo

Peço-te o prazer legítimo
E o movimento preciso
Tempo tempo tempo tempo
Quando o tempo for propício
Tempo tempo tempo tempo

De modo que o meu espírito
Ganhe um brilho definido
Tempo tempo tempo tempo
E eu espalhe benefícios
Tempo tempo tempo tempo

O que usaremos pra isso
Fica guardado em sigilo
Tempo tempo tempo tempo
Apenas contigo e comigo
Tempo tempo tempo tempo

E quando eu tiver saído
Para fora do teu círculo
Tempo tempo tempo tempo
Não serei nem terás sido
Tempo tempo tempo tempo

Ainda assim acredito
Ser possível reunirmo-nos
Tempo tempo tempo tempo
Num outro nível de vínculo
Tempo tempo tempo tempo

Portanto peço-te aquilo
E te ofereço elogios
Tempo tempo tempo tempo
Nas rimas do meu estilo